O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei
8.069/90) completa 25 anos nesta segunda-feira (13). Embora seja considerada
uma legislação avançada e exemplar para outros países, especialistas da área
apontam que o texto precisa ser efetivamente aplicado para garantir uma
transformação real na vida de meninos e meninas do País. Muitos aspectos da lei
ainda não saíram do papel.
Nesses 25 anos, cerca de 20 leis entraram em vigor
modificando o estatuto. Ainda estão em análise na Câmara dos Deputados mais de
500 propostas para alterar o ECA, mais de 50 delas com o intuito de endurecer a
punição aos adolescentes infratores. Um desses projetos de lei é o 5454/13, da
ex-deputada Andreia Zito, que amplia de três para oito anos o tempo máximo de
internação em unidades socioeducativas para o menor de 18 anos que cometer atos
infracionais equiparados a crimes hediondos.
Para o conselheiro tutelar Iran Magalhães, essa é uma
mudança necessária no ECA. “Quando um adolescente pratica ato equivalente a
crime hediondo, tem que se pensar em tempo maior de internação”, diz. “Porém,
com bastante ressalva pois não é a internação pela internação, é a internação
no sentido de você tentar socializar esse cidadão para a sociedade",
completa.
Já Fábio José Bueno, promotor de Justiça da Infância e da
Juventude de São Paulo, acredita que aumentar o período de internação não vai
mudar o quadro de violência praticada por jovens, porque o juiz vai poder rever
esse tempo. “O juiz tem uma margem de liberdade muito grande no ECA, e essa
margem, sinto em dizer, não está sendo bem exercida”, afirma. Em audiência na
Comissão de Cultura da Câmara no dia 17 de junho, ele defendeu a redução da
maioridade penal.
AVANÇOS
O objetivo do ECA é a proteção de crianças e
adolescentes, garantindo a eles o direito à vida, à saúde, à alimentação, à
educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,
à liberdade, e à convivência familiar e comunitária.
Relatora na Câmara da proposta que originou a lei, a
ex-deputada Rita Camata crê que o estatuto é uma norma completa, que protege a
criança desde a gestação. “O estatuto garantiu o pré-natal da mãe, que não
existia por lei; as campanhas de vacinação; o teste do pezinho; a garantia
legal de que crianças e adolescentes devem vivem em ambiente familiar”,
enumera.
Para a consultora da área de direitos humanos da Câmara
Debora Azevedo, o ECA trouxe uma grande transformação na forma de ver a criança
e o adolescente no País. “A legislação que existia antes, o Código de Menores
(Lei 6.697/79), era muito focada só no infrator; a criança e o adolescente eram
mais um objeto de intervenção”, explica. “O ECA mudou radicalmente isso.
Meninos e meninas passaram a ser vistos como sujeitos de direitos, que
necessitam de proteção e que devem ter prioridade absoluta em todas as
políticas públicas existentes.”
MUDANÇAS CULTURAIS
A presidente do Conselho Nacional de Juventude, Ângela
Guimarães, destaca que o ECA promoveu uma série de mudanças culturais, como a
forma de ver o trabalho infantil. “Uma concepção comum anterior ao ECA era de
que ‘cabeça vazia, oficina do diabo’. A criança e o adolescente tinham de estar
necessariamente trabalhando. O ECA normatizou que, até os 16 anos, eles não
podem trabalhar, salvo em condição de aprendizagem, a partir dos 14 anos”,
salienta.
Outro hábito que também foi mudado, conforme Ângela, é o
da violência como instrumento mediador da educação familiar. “Era muito comum
palmada, castigos físicos, violência excessiva, e hoje a gente tem o ECA e
outras normas mais recentes, como a Lei Menino Bernardo (13.010/14), que coíbem
isso”, ressalta.
TRANSFORMAÇÕES LENTAS
Ex-ministra da Secretaria de Direitos Humanos, a deputada
Maria do Rosário (PT-RS) é outra a destacar que foram muitas as conquistas
obtidas nos últimos 25 anos: “A gente pode comemorar a redução do trabalho
infantil, a universalização das crianças na educação fundamental, a diminuição
da mortalidade infantil”, cita.
Porém, na visão da parlamentar, as mudanças ocorrem de
forma mais lenta porque a sociedade e o Congresso estão mais preocupados em
mudar o estatuto do que em tirá-lo do papel. “Nossos grandes desafios, nesses
25 anos, foram implementar o ECA e mantê-lo. Desde o primeiro momento, ele foi
contestado, e mudanças foram propostas, como se ele fosse inviável. Isso
atrasou algumas políticas”, argumenta.
Câmara dos Deputados